Com a elevação da incerteza, em sua última reunião, o Copom avaliou que seria necessário um maior grau de liberdade para a condução da política monetária. Assim, mesmo com o cenário-base não se alterando substancialmente, optou pelo encurtamento do prazo do forward guidance. Entretanto, tal alteração refletiria tão somente uma análise de custo-benefício da utilização do instrumento. Em se confirmando o cenário esperado, sinalizou-se uma redução -0,50 p.p. em maio. Ademais, reiterou que para reforçar a dinâmica desinflacionária seria necessário que a taxa de juros se mantivesse cuidadosamente em terreno contracionista.
Apesar de que o Copom assinalar que seria um equívoco interpretar a mudança na sinalização futura como uma indicação de alteração do ciclo de política monetária, as apostas de mercado mudaram gradualmente para um corte de -0,25 p.p. em junho. Contudo, por causa das diferentes interpretações acerca dos reflexos da atualização do conjunto dos dados no cenário esperado, surgiu um dissenso nas análises para a decisão de maio, com o mercado futuro de juros indicando uma redução de -0,25 p.p. e a pesquisa Focus de -0,50 p.p.. Em resumo, a incerteza recrudesceu não só no que tange à taxa terminal de juros, mas também ao ritmo das eventuais quedas.
De fato, desde a última reunião, com a maior lentidão do processo desinflacionário nos EUA, houve uma importante alteração na avaliação da trajetória da política monetária a ser praticada pelo Federal Reserve. Assim, cresceram as apostas de que o início do processo de flexibilização monetária não ocorra em 2024, levando a uma recalibragem significativa na precificação dos ativos internacionais. A rentabilidade dos Treasuries elevou-se fortemente, o real sofreu uma expressiva depreciação e da mesma forma o preço do barril do petróleo em reais. Com isso, certamente, as projeções de inflação do Copom, que se situavam em 3,5% para 2024 e 3,2% para 2025, deverão se elevar.
De forma compensatória, com a elevação dos prêmios de risco, a taxa real ex-ante de juros aumentou aproximadamente 0,50 p.p. em 2024, oscilando no momento em torno de 6,5% a.a., nível contracionista quando comparado com os 4,5% a.a., considerado como neutro pelos estudos do Banco Central. Adicionalmente, a inflação corrente contínua apresentando trajetória favorável, embora persistam questionamentos acerca do comportamento dos preços de serviços e sua relação com as variáveis do mercado de trabalho. Os indicadores de atividade vêm surpreendendo positivamente, com as projeções de crescimento do PIB para 2024 já superando 2,0%. Ainda que as expectativas encontrem-se desancoradas em relação ao centro da meta, não houve deterioração significativa com a materialização com o novo quadro para a taxa de câmbio.
Acreditamos que seja necessário cautela a avaliar os mecanismos de transmissão da conjuntura externa sobre a dinâmica inflacionária interna com a alteração de cenário, depurando o que de fato seriam mudanças estruturais e o que seriam fruto da volatilidade, em meio às dúvidas quanto à flexibilização monetária nos EUA e conflitos geopolíticos.
Apesar da elevação da adversidade no cenário externo e da desancoragem das expectativas inflacionárias, entendemos que há condições para o cumprimento do forward guidance da última reunião, ou seja de uma redução de -0,50 p.p. na taxa Selic para 10,25% a.a. em maio. Dessa forma, evitar-se-ia o entendimento de que fosse uma promessa não cumprida, o que poderia ter impacto sobre a credibilidade futura da comunicação, além de volatilidade. A decisão não teria impacto significativo na curva de juros, manteria a política monetária em patamar contracionista e a credibilidade do compromisso do Copom com a convergência da inflação à meta. Por fim, ao atenuar a volatilidade, essa decisão implicaria também na suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
Boa leitura!