As instituições financeiras têm um papel fundamental no desenvolvimento da economia, na medida em que são intermediárias, viabilizadoras e financiadoras de diversos projetos e modelos de negócio. Nos últimos anos, os fatores ambientais, sociais e de governança se tornaram tão importantes quanto os econômicos como indicadores para o crescimento sustentável e, atentos a esta tendência mundial, o Banco Central passou a exercer maior regulação sobre a temática ESG. Esse movimento gradual do regulador culminou, em 2022, com uma série de normas sobre a necessidade do desenvolvimento de uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), definindo especialmente o que considera relevante para a gestão de riscos.
Apesar deste cenário, de acordo com a Deloitte, a maioria das organizações ainda não considera o tema em seus planejamentos de auditoria interna, mesmo tendo uma agenda ESG estabelecida. Um estudo realizado pela consultoria em 2021 – o AuditBoard – entrevistando 900 profissionais de risco e compliance na América do Norte, mostrou que 59% não tinha certeza ou não aplicava esse procedimento vital para avaliar a conformidade dos controles internos e verificar a eficácia das atividades de sustentabilidade empresarial. “É uma aferição de base internacional, mas que espelha o que vemos no Brasil, segundo nossas auditorias realizadas e o que vemos no setor”, disse Maria Cristina Prioli, Sócia de Risk Advisory da Deloitte no Brasil.
Para auxiliar neste desafio e orientar os associados, Priolli realizou uma apresentação em setembro aos membros da Comissão de Auditoria da ABBC, na qual deu dicas e orientações sobre boas práticas em auditoria de ESG e relacionou as principais perguntas hoje que os auditores internos em cada banco precisam ter em seu checklist para a aferição das conformidades em atendimento pelo menos ao mais urgente exigido hoje pelo BC em sua normatização.
Primeiramente, a especialista definiu como fundamental a consideração do ESG como transversal, ou seja, que precisa ser levado em conta em todas as auditorias realizadas na instituição financeira. “Se vou auditar a área de compras, tenho de observar a responsabilidade social; no crédito, o risco climático; se vou auditar modelo, preciso verificar o cenário de estresse. E em todas as áreas do banco é preciso ter em mente o gerenciamento de riscos em ESG.”
Prioli explicou que a Supervisão do BC hoje entende que o mercado está se adequando ao grande universo da sustentabilidade. Apesar disso, não está observando apenas a existência ou não de uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática na organização. O regulador quer saber quem a aplica na instituição financeira, quais são os principais indicadores determinados para a verificação das conformidades e quais são as materialidades mais importantes para os stakeholders envolvidos. “Também é necessário deixar sinalizado como serão os passos para a próxima auditoria, especialmente se o olhar será ‘cross temas’ ou mais específico em uma questão’”, completou Prioli.
Como as equipes de auditoria nos bancos atualmente são enxutas e a avaliação em ESG se aplica a todas as áreas, a Deloitte considera relevante o aproveitamento de métricas que a organização já tenha de forma robusta e confiável, como suporte, além da utilização de uma ‘segunda linha’ de auditoria que não seja diretamente ligada à equipe principal de auditoria, mas que possa prestar assistência para um double check.
Outro ponto é um olhar para a estratégia ESG, ou seja, definir os temas ESG mais importantes para a organização e seus stakeholders. ‘Não adianta pegar todos os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU e tentar aplicar auditoria em todos. Precisa ter um olhar de definir qual é o foco da sua instituição”, disse Prioli. Por fim, a especialista mostrou que é fundamental estabelecer perguntas-padrão ESG em todos os processos de auditoria e deu diversos exemplos de questões que garantem um controle mais robusto e o cumprimento mínimo de uma estratégia, baseado em boas práticas e no que é exigido pela regulação nacional.
Segundo a Deloitte, com este passo a passo, haverá um bom avanço do processo de auditoria, mas para evoluir de forma robusta é essencial investir em conhecimento ESG nas equipes e aumentar o engajamento para o tema. Segundo pesquisa AuditBoard realizada em 2021 na América do Norte, 56% dos executivos entrevistados disseram que o ‘gap’ de informação era a maior preocupação na integração do ESG ao plano de auditoria interna.
“Como é um tema novo e com muitas variações, a chance de uma auditoria ficar rasa aumenta. Torna-se, portanto, vital criar essa cultura de disseminação de conhecimento e engajamento, além de focar nas materialidades mais relevantes apenas e observar como outros players estão desenvolvendo os seus frameworks”, disse Prioli, que concluiu: “O trabalho de auditoria não é somente verificar, mas provocar hoje o que será exigido lá na frente. O futuro será medido pelo que fizermos hoje.”